domingo, 30 de agosto de 2009

VIDA SERTANEJA



O cantar dos passarinhos
borbulhando em minha mente
numa saudade eminente
traz de volta os meus caminhos.
No quintal velha mangueira
dando sombra à churrasqueira
o lazer dos meus vizinhos.

Nas cordas do violão, mora
o fio de toda emoção
arrochando o coração
fazendo gemer quem chora.
Lá na porta da cozinha
suspira fundo a mãezinha
lembra alguém que foi embora.

A fumaça dribla o choro
da moçada no quintal
vão disfarce, não faz mal,
desse jeito dá namoro.
Sertanejo tem na raça:
- É na dor que vem a graça
da fortaleza de um touro.

Essa vida do sertão
cobre o leito do presente
abrigando a minha mente
com coisas do coração,
mesmo assim eu passo frio
tenho meu leito vazio
não tem corpo essa ilusão.

Dáguima Verônica de Oliveira

sexta-feira, 28 de agosto de 2009

A VELHA ROSEIRA


As lágrimas viram bolhas...
O mar cansado secou,
em seu leito algumas folhas
que a tempestade deixou.

Revive tantos horrores
nas folhas secas trazidas
por um oceano de dores,
hoje em águas já corridas.

Se recolhe, então, em prece
e faz trovas de improviso,
lindos versos ela tece
o amor chega sem aviso.

A saudade não permite
os espinhos sobre a rosa
sabe ela do seu limite
só no amor fica formosa.

Podada por tantas dores
no deserto ela se abriu
dos espinhos nascem flores...
Toda a roseira floriu.

Dáguima Verônica de Oliveira

SONETO


PÁGINA VIRADA

Volto à página da vida, ao avesso
corro em pontos de medo, era gracejo
fuga dos próprios grilos, hoje eu vejo
impulso à própria sorte, reconheço.

Dei-me as cordas do tempo e solto as pontas
vai passar o aviso e eu só devaneios
acordada, eu colhi os meus anseios
por mim mesma eu paguei as minhas contas.

Nessa visão eu vejo, os meus instantes
proliferando em tempos inconstantes
venturas de um engano que ora invento.

Se no poço tem molas, pula o barro
abrindo belas flores, que bizarro!
Fecho o livro, chegando ao meu intento.

Dáguima Verônica de Oliveira

quinta-feira, 27 de agosto de 2009

NO HORIZONTE DA ESPERANÇA


No horizonte da esperança,
abrem-se trilhos de prata.
De fronte erguida ela alcança
uma clareira na mata.

Ainda é tempo para amar,
- brinca o barulho da luz,
esse luar quer falar
que aqui dentro tem Jesus.

Em desespero, o meu barco
quebra seus remos da luta,
na lambada desse charco
me jogo em terra de escuta.

Fica o luar comovido
abrem-se, então, as compotas,
um clarão mais atrevido
risca do chão as derrotas.

Dáguima Verônica de Oliveira

REVERSO



Eu tenho aqui na garganta
o meu grito aprisionado
não sai, porque não adianta
gritar ao velho passado.

Fugir de mim mesma, ousei,
não pensei nas conseqüências;
chegando lá não me achei,
eu não tinha referências!

Controlei meu sentimento
e tracei uma divisa
prendi a força do vento
e dei asas para a brisa.

Tem que existir o conflito
para discernir a paz
não tem silêncio sem grito
nem ordem sem capataz.

Injustiça é nosso avesso,
fazemos tudo escondido:
na aparência um endereço
e por dentro o do bandido.

Fui buscar o meu reverso
lá nas dobras da “arte-manha”,
estava em forma de verso
no topo de uma montanha

Do vale emergi ao topo
da relva virei madeira
do poço fui ao escopo
e em tudo fui verdadeira.

Somente quando “voltei”
a enxergar o meu escuro
das escamas me livrei
encontrando o que procuro.

Ladrilhando o meu futuro
com as pedras da humildade
pude ver no meu escuro
um mundo de claridade.

Dáguima Verônica de Oliveira

CAMPONESA




Eu meto a espora no Baio,
cortando mato e campina
não tenho medo, eu não caio,
me segura a Mão Divina.

Um velho chapéu de palha
uma bota já rasgada
isso é toda minha tralha
que preciso nessa estrada.

Tenho o Baio como amigo,
que na hora da porteira
dá patada no inimigo
e sai logo na carreira.

Amazona de carteira
meu galope é desbravar
para mim não tem fronteira
que eu não possa atravessar.

Sou camponesa valente
na raça traço meu trilho
mato a presa com meu dente
e o chicote é meu gatilho.

Dáguima Verônica de Oliveira

O ENTARDECER LÁ NA ROÇA




O entardecer lá na roça
de tão bonito que ele era,
- nas cores da primavera
pintava nossa palhoça.
Na estradinha da porteira,
morava a velha paineira
bem em frente à nossa choça.

Feito fios de ouro do sol
o vermelho era trançado,
diziam que era bordado
aquele nosso arrebol.
Era um céu de muitas cores,
cenário de mil amores,
canteiro de girassol!

Passando a língua no coxo,
as vaquinhas no curral,
raspavam resto de sal
deixado pelo boi mocho.
Querendo abrir a tramela,
assanhada, a Sentinela,
cobiçava o potro roxo.

Carregada com seus cachos
a paineira envelhecida,
- pensionato de acolhida,
no aconchego de seus braços,
recebendo a passarada
para mais uma noitada
entre cochilos e “amassos”.

Meu pai olhando o matinho,
sentado no seu pilão,
sem descuidar do gavião
querendo comer pintinho.
A mãe, “banando” feijão,
já eu, cardava algodão,
sentada no meu banquinho.

Nessa tarde quase morta,
ao som de moda caipira,
o meu pai , na alça de embira,
bota o seu chapéu na porta.
Vai pro rabo do fogão,
faz um pito com a mão,
se a palha é seca, que importa?

Minha mãe pega a bacia
esquenta água na fornalha,
põe no cesto a sua malha
que tricota para a tia.
Bota os pés para lavar
logo após já vai deitar
bem longe já vai o dia.


Chega a hora de deitar,
- o momento do rosário,
todo dia nesse horário
a família vai rezar.
- “Bença” mãe e “bença” pai,
cada um pro quarto vai.
O silêncio vai reinar!



O velho colchão de palha
barulhento e bem macio
é muralha contra o frio
naquela casa sem calha.
Todo mundo já deitado
o meu pai mais sossegado
vai pegar água na talha.

Dáguima Verônica de Oliveira